quarta-feira, 26 de maio de 2010

A política externa no debate eleitoral

A política externa nunca ocupou um papel de destaque no debate eleitoral brasileiro. Ressalta-se sempre, para justificar tal fato, a complexidade do tema, o baixo interesse da sociedade e a conseqüente baixa captação de votos que o debate gera. A política externa não atraia a eleição do eleitor e, portanto, os custos de se entrar nesse debate não gerariam ganhos na mesma proporção.

No aquecimento da disputa eleitoral desse ano, que promete ser acirrada, os principais candidatos ainda não apresentaram propostas concretas que alimentarão os eleitores a firmar suas opções de voto. Todavia, o confronto de ideias começa a surgir com maior força, seja provocado pelos próprios candidatos ou pelas circunstâncias políticas que os cercam e formam.

Nesse momento, as discussões acerca da política externa brasileira têm ganhado especial atenção. No mês de abril, o chanceler Celso Amorim compareceu ao Senado como forma de destravar a apreciação da indicação de embaixadores brasileiros para postos no exterior, que estavam paradas na comissão de relações exteriores da casa. No dia seguinte, foi a vez do Ministro Nelson Jobim dar explicações sobre a compra dos caças e da assinatura do tratado militar com os EUA.

A imprensa deu atenção ao debate com o líder da oposição, que acusou o neopetismo do ministro Amorim, outrora mais próximo de José Serra, declarando ser seu amigo pessoal. Mais importante, porém foi que a oposição encarou o debate de conteúdo: questionou a criação de novas embaixadas brasileiras em alguns países menores, sem importância, sob a mera justificativa do interesse comercial de algumas empresas nacionais, a "benevolência" com que trata seus vizinhos "mal-comportados" e a displicência com que afronta a comunidade internacional, leia-se Estados Unidos, no caso do Irã. 

Por trás do momento atual, paira o embate permanente entre a opção universalista e a ocidentalista/americanista, ou seja, entre aqueles que percebem que os interesses brasileiros devem ser buscados e promovidos em toda a parte do globo e aqueles que, sem atentar para a complementaridade das alternativas, propagam que o eixo principal das nossas relações externas deve ser de alinhamento aos nossos parceiros tradicionais do ocidente, EUA e Europa.

Os ataques ao relacionamento do Brasil com os vizinhos parecem ter no horizonte apenas o jogo eleitoral. Numa perspectiva de médio ou longo prazo, é preciso considerar que os problemas recentes ocorridos com Bolívia, Paraguai, Equador e mesmo Argentina e Uruguai, esses últimos em matéria comercial, vêm sendo paulatinamente superados e a perspectiva de construção da América do Sul como um polo de um sistema internacional multipolar, colocada em outro patamar com a institucionalização do diálogo multilateral pela criação da UNASUL, vai se consolidando. Resta lembrar que mesmo os assuntos mais quentes da agenda política regional, a questão das bases norte-americanas na Colômbia e as supostas relações da Venezuela com as FARC, foram levadas ao Conselho de Defesa Sul-americano. E, não menos importante, a América do Sul se consolida como importante destino das exportações brasileiras de maior valor agregado, como destino de investimentos externos brasileiros e, portanto, origem de lucros em moeda estrangeira para nossas empresas que se internacionalizam usando a região como plataforma inicial.

Vão na contra-mão da política externa da última década, portanto, inclusive considerando a segunda metade do segundo governo Cardoso, as afirmações de José Serra, de diminuir a importância do Mercosul e de acusar o governo boliviano de ser cúmplice no tráfico de cocaína para o Brasil. Seu governo poderia representar uma ruptura no que tem sido a afirmação da América do Sul enquanto região política própria, ideia que ganhou força com a institucionalização na UNASUL.  

Com relação à ex-ministra Dilma Roussef, seu eventual governo promete ser continuação da política externa de Lula para América do Sul. Até porque o assessor especial da Presidência da  República para assuntos internacionais, o professor Marco Aurélio Garcia, defensor intransigente da integração sul-americana, ocupa papel de destaque na campanha petista.

Todavia, as posições não estão totalmente esclarecidas. Há espaço ainda para que, com a divulgação dos planos de governos dos candidatos e o aquecimento da campanha eleitoral, que em breve deverá disputar as atenções com a Copa do Mundo, haja um debate rico em torno dos caminhos possíveis da Política Externa Brasileira. A atual projeção internacional do Brasil e o debate que tem gerado na imprensa parecem indicar que, nas eleições presidenciais de 2010, teremos a oportunidade de discutir as opções internacionais que mais contribuem para o processo de desenvolvimento do país e, àqueles que aceitam acreditar que o Brasil pode falar alto no palco internacional, a postura que mais pode induzir para o fortalecimento do multilateralismo, para a construção de uma ordem multipolar mais estável econômica e politicamente.     

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