sexta-feira, 16 de julho de 2010

Despedida

Car@s Amig@s,
esse é o último post por aqui.
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Continuem acompanhando.
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terça-feira, 29 de junho de 2010

De Getúlio a Lula - e, novamente, ao banco central

Mais uma vez, volto ao livro Brasil: entre o passado e o futuro.
Agora é a vez do artigo do Emir Sader, Brasil, de Getúlio a Lula.
O texto, sucinto para tentar abranger 8 décadas da história social, política e econômica brasileira, discorre sobre os grandes movimentos contraditórios da sociedade brasileira, na defesa do atraso ou afirmação da vontade do progresso, na explicitação de valores pretensamente universais ou defesa do interesse nacional, a articulação do movimento social brasileiro ou a satisfação da redemocratização no plano jurídico-político, a vitória e o fracasso neoliberal dos anos 90 ou a redescoberta do Estado na presente década, já com um país completamente mudado.
Como não poderia deixar de ser, do ponto de vista acadêmico o texto apresente lacunas. Sua passagem superficial por pontos centrais da história brasileira podem questionar a validade de uma ou outra afirmação ou viés interpretativo. No entanto, é válido, do ponto de vista ensaístico, o paralelo estabelecido entre os "Brasis" de Getúlio e Lula, e determinante os desafios aventados para os próximos anos.
O paralelo se dá em três aspectos: a) Governo: tanto em Getúlio, como Jango ou Lula, marcado por coalização de classes, pluriclassistas, que assumiram projetos de unidade e desenvolvimento nacional, com intenso enfoque em políticas sociais; b) a base popular, c) as forças antagônicas são as mesmas, baseadas no hegemonia do capital financeiro, agronegócio e mídia oligárquica.
E, diante disso, os desafios, para Emir, estão na superação da base desses elementos que sustentam os defensores do atraso: hegemonia do capital financeiro, modelo agrícola e a ditadura da mídia privada.
A pergunta que fica é se um possível, talvez agora mais provável, governo Dilma Roussef teria condições e vontade, na nova coalização que se estabelece, de enfrentar esse tripé do antagonismo conservador. Parece sim disposta a discutir um marco regulador para a comunicação, o que, pelos gritos dos velhos oligarcas da grande imprensa tradicional, embora decadente, deve ser muito complicado. No que diz respeito ao campo, suas posições, ora vestindo o boné do MST e ora tentando enquadrar o movimento, não dão certeza de que conseguirá avançar, seja pela força do agronegócio ou pela falta de ousadia no avanço da reforma agrária que, de tão atrasada, já é falsamente acusada de anacrônica. E a hegemonia do capital financeiro se manteve no governo Lula, peso da herança dos anos neoliberais e fruto de escolhas desalinhadas de um governo que, como qualquer outro, não consegue aparar todas as contradições do processo decisório no plano estritamente interno.
O mais dramático, a meu ver, é que essa hegemonia está na base de sustentação desse governo. Se, a base da pirâmide social é acomodada por forte políticas de transferência de renda, o cume é agraciado com a benevolência do rentismo. Se não tão alto quanto no período anterior, ainda a ponto de garantir aos bancos os maiores lucros desse país. Não creio ser correta a insistência numa ruptura do modelo institucional do Banco Central, mas está claro que caberá ao sucessor de Henrique Meirelles um papel central para o êxito do enfrentamento desse desafio. Que, dessa vez, não seja escolhido no ninho tucano ou dentre os representantes do atraso, justamente essas forças antagônicas conservadores apontadas por Emir Sader.

domingo, 27 de junho de 2010

O que agregam os Vices?

Já tinha postado aqui um artigo sobre a escolha dos Vices. Falava da importância da definição dos nomes para refletir sobre o conteúdo programático de cada chapa. Uma chapa Dilma e Temer, por certo, seria diferente de uma chapa de Dilma e Meirelles, ou Dilma e Geddel, por exemplo.

No entanto, vou deixar essa discussão sobre conteúdo programático pra depois. Fico pensando agora o que cada um dos principais vices escolhidos agregam na corrida eleitoral.

Primeiro, creio que o Vice da Marina, Guilherme Leal, o homem da Natura, ajuda a diminuir as resistências do empresariado à candidata verde. Além disso, ela, se apresentando como líder, diferente dos perfis gerenciais de Serra e Dilma, agrega a chapa um homem de sucesso no mundo dos negócios, porque não, um gerente. Em termos eleitorais, não tem apresentado, até agora, qualquer resultado.

Segundo, Temer, com certeza, agrega no grau de governabilidade de um possível / provável futuro governo Dilma. A despeito de algumas dissidências regionais, consegue dar o maior grau de unidade possível a um partido diverso, justamente o maior partido em número de filiados e constantemente uma das maiores bancadas do Congresso Nacional. E é na governabilidade que o PMDB já agrega ao governo Lula, aprovado por imensa maioria da população, é que está a sua grande ajuda. Ajuda mais porque não atrapalha, mesmo com Sarneys, Barbalhos e Calheiros

Terceiro, o vice do Serra, até agora, Álvardo Dias, conformando a chapa puro sangue paulista e tucana da oposição. Serra, com Dias, agregou confusão no lado oposicionista. Minha hipótese é que o ex-presidente-eleito José Serra  quer, mesmo saindo das eleições derrotado, continuar sendo homem importante no ninho tucano, e quer escolher ele próprio a principal voz da oposição. Alça um tucano próximo e tenta pôr Aécio à margem, que terá a sombra de um senador tucano candidato a vice-presidente no Senado Federal. E o DEM fica sempre com a segunda posição na chapa. 

Senão, vejamos. Serra é derrotado e dificilmente concorrerá de novo. Se o vice fosse do DEM, um nome forte, conhecido, talvez esse nome encarnasse a voz oposicionista e se cacifasse para as próximas eleições. Emplacando o nome de Álvaro Dias, mantém o PSDB como a principal voz da oposição para ser a cabeça de chapa em 2014, sem deixar de cutucar Aécio pelas mágoas deixadas pelo mineiro não aceitar baixar a cabeça para Serra.

Serra quis puxar para si a decisão sobre o futuro da oposição brasileira, que parece ir, junto com ele, ladeira abaixo. O DEM esperneia, mas os escândalos no DF e o seu discurso radical contra um governo com altíssima aprovação também o encaminham para o definhamento.

domingo, 20 de junho de 2010

Instituições de Estado e carreiras públicas - o caso do portal do planejamento

Esse semana, o Ministério do Planejamento lançou o portal do planejamento, contendo uma série de documentos desenvolvidos pela Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos da SPI/MP. Trata-se de um dos melhores trabalhados já desenvolvidos por aquela Secretaria a respeito das políticas públicas em curso no país, divididas por temas, apontando aspectos positivos e negativos em todas elas.


A imprensa logo aproveitou do material para explorar as críticas e municiar a oposição. Reacendeu um franco de fogo amigo dentro do governo, e alguns dos principais veículos de comunicação do país repercutiram o tema, a começar pelo Valor Econômico, que deu a página especial de sexta-feira, a CBN, Estadão, Veja e Globo.


Como resposta, o governo retirou do ar o portal. E isso gerou nova polêmica na imprensa e também dentre os colegas analistas de planejamento e orçamento, que compõem a maioria do corpo técnico da secretaria. Misturaram-se, de um lado, naturais distintos posicionamentos políticos em uma carreira que abraça perfis diversos e incômodo do corpo técnico com a direção com as percepções com relação ao desenvolvimento do projeto e o posicionamento da carreira e da instituição dentro do jogo político do governo.


No meu ponto de vista, de quem tem na SPI a sua principal referência de trabalho mas vê o processo com uma certa distância, a discussão alimenta alguns debates que devem ser encarados de frente: a questão da neutralidade técnica, a separação entre Governo e Estado, mecanismos de incentivo ao exercício da democracia e transparência da ação pública e, por fim, a posição diferenciada que existe entre as instituições de estado e as carreiras públicas.

Encaro a pretensa neutralidade técnica, ou a postura imparcial da burocracia como uma falácia. A defesa de neutralidade tem, ainda que indiretamente, impactos para um ou outro lado. Ademais, por trás dessa postura, muitos escondem preferências políticas que não explicitam seja por comodismo dos cargos que ocupam ou pelo risco que, naturalmente, isso acarreta. Obviamente que a imprensa pode usar o episódio, e está o usando, da forma que mais lhe convém, e isso não deve ser o único fator que oriente as nossas ações. Mas desconhecer, ou querer desconsiderar, os impactos políticos das nossas ações é muita pretensão da nossa parte, e pode, inclusive, nos distanciar ainda mais do núcleo decisório do governo.

Isso tem a ver com a discussão, que sempre considerei ilusória, de separação entre estado e governo. "Somos uma instituição de estado" e devemos ficar alheios às influências políticas. Isso não me parece real. Aliás, não há Estado sem governo, embora, se quiserem, possa haver governo sem Estado. Não há como separar claramente as duas coisas. No entanto, há espaço, ou deveria haver (e não estou dizendo que há o suficiente nesse governo) para construções que ultrapassem os limites dos governos. Mas isso deve envolver toda a sociedade, ou os mais múltiplos atores possíveis, e não apenas a burocracia.

E essa discussão, por sua vez, se conecta com a defesa da transparência e da democracia. Sou um defensor constante da abertura de mais canais de interlocução da sociedade com o governo. Acho que as tecnologias da informação ajudam isso, a internet em particular, mas ainda temos muito o que avançar. Creio que as fórmulas apresentadas até hoje ainda não conseguiram resolver essa questão, tanto do ponto de vista político como técnico/burocrático. Entendo, no entanto, que a discussão em torno da publicação do portal, pra quem o vê de fora, embora exercício extremamente válido para a melhoria das políticas públicas, pode também muito bem ser entendido como parte de um processo decisório interno ao governo, que não necessariamente precisa ser publicizado, e também não se confunde com democracia participativa. Embates como esse há em qualquer governo , mas normalmente o que se externa é apenas a resultante do jogo de forças políticas que se enfrentam dentro do governo. Me parece que alguém "comeu bola" em publicar uma coisa não discutida internamente, ainda mais num período de tensão pré-eleitoral. Nesse sentido, compreendo a retirada do portal do ar.

Isso não significa que não deva haver críticas às políticas de governo. Mas a SPI não é uma instituição de pesquisa. O nosso esforço em propor melhoria às políticas públicas é também extremamente válido, deve ser mantido. Defendo que o exercício seja contínuo. Mas isso não implica NECESSARIAMENTE em torná-las públicas. Sua retirada da internet não deveria impactar em nada o processo que deveria se iniciar de discussão dentro do governo, o que só reforça que sua eficácia não está relacionada com sua publicação. Agora, entendo que a publicação pode ter criado resistências dentro do governo, e que isso pode tornar o trabalho de discussão interna mais difícil. Desconhecer esses aspectos é também desconhecer a essência política da nossa função.

Por fim, mas não menos importante, temos, a carreira, uma instituição de direito privado para fazer discussões que se apartam das instituições e devemos aproveitar isso. De lá, temos mais liberdade para fazer as críticas que acharmos conveniente, propor à sociedade e ao governo discussão de temas que consideramos importantes. Acho que a Assecor - Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Planejamento e Orçamento, principalmente agora depois de ter realizado um importante seminário sobre as relações entre o papel do Estado e o lugar do planejamento na busca do desenvolvimento, se mostra um espaço importante para realizarmos essas discussões.

Defendo a mobilização nesse espaço. Seu fortalecimento acarretará o reconhecimento maior da carreira e a construção de um espaço próprio capaz de ser mais um mecanismo de aproximar Estado e Sociedade e de exercer pressão sobre o governo para a melhoria da oferta das políticas públicas. Não podemos esperar ou exigir das instituições de Estado uma postura além das limitações impostas pelas amarras ao governo, de qualquer coloração que ele seja.
    

quinta-feira, 17 de junho de 2010

A sociedade que luta

Márcio Pochmann e Guilherme Dias apresentam mais um tópico do livro "Brasil entre o passado e o futuro", lançado no congresso do PT, que venho comentando aqui: A sociedade pela qual se luta . Pareceu-me mais um chamamento à organização social pela luta ao estabelecimento de um novo padrão civilizatório mais adequado à sociedade pós-industrial do que uma ode ao Governo Lula. E esse é, ao mesmo tempo, o grande mérito e a maior fragilidade do texto.

O artigose divide em três partes: Uma caracterização sintética da evolução da sociedade brasileira, com ênfase nas diferenças entre os períodos de governo FHC e Lula(qual sociedade?); a segunda parte destaca os meios que deveriam ser mobilizados para avançar (como e para que lutar?); e a terceira o anúncio de um projeto de sociedade que se quer construir (sociedade de todos no século XXI).

Pochmann discorre aí suas idéias bastante conhecidas - e bem mais desenvolvidas - de outros textos, na qual defende a redução da  jornada de trabalho, a entrada postergada no mercado de trabalho, a educação continuada ao longo da vida ativa, com ganhos de qualidade de vida e aumento do trabalho autônomo da população, que tende a chegar a uma expectativa de vida de 100 anos muito em breve. Invoca a necessidade de se construir um novo padrão de produção e consumo, condizentes com os princípios da sustentabilidade.

São, de fato, idéias inspiradoras de um dos maiores intelectuais brasileiros, na opinião desse modesto blogueiro. E a busca por essa sociedade deve caber à formação de uma nova maioria política sensível a esse projeto. Nessa hora, Pochmann é tímido, esquece que saiu dos gabinetes mofados da acomodada academia brasileira e está a frente de uma das mais qualificadas agências governamentais, o IPEA. Estimula a organização da sociedade para a luta, acomodando as forças do governo na inércia.

Mais ainda, os canais de interlocução da sociedade com o Estado são o ponto mais importante destacado pelos autores quando tratam do "como lutar". Ao lado disso, defendem o papel do Estado no planejamento de longo prazo, no desenvolvimento de um projeto de país, e da instigação da sua ação de modo mais matricial, trans e intersetorial. Turvou-lhe aí o olhar mais crítico para poder apontar que o atual governo, a despeito dos inegáveis avanços, poderia ter feito muito mais a conceber um espaço maior para o planejamento, fazendo-lhe entender a sua essência política, e não o entricheirando nas tecnicalidades formais.

Por fim, é tímido demais também no tratamento da financeirização da economia ao atenuar a força de suas críticas, compreensível no caráter e objetivo do texto que lhe foi encomendado, mas incômodo aos olhos dos muitos que vêem a urgência de avanços mais significativos nessa área e são contrariados com a postura sempre conservadora do Banco Central do Sr. Meirelles.

A mobilização social é, portanto, o norte do texto, que demonstra que as marcas mais sentidas da evolução da humanidade se deu nas bases de uma sociedade que lutou. Em período eleitoral, espero que não nos acomodemos com os acertos do governo Lula que, certamente, recomendam a eleição de sua candidata no quadro sucessório, mas que continuemos lutando.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Questões abertas da democracia participativa

Um dos grandes temas ainda pendentes para o governo, para a burocracia, para as elites e mesmo para a sociedade organizada é como introduzir, de fato, a sociedade civil na agenda governamental. Como se aproveitar da democracia participativa, somando-a à democracia representativa, de modo objetivo, com resultados concretos na forma de implementação e escolhas das prioridades governamentais.
De fato, não se pode negar que o governo Lula representou um avanço nesse processo. Esse é o foco do texto do Ministro Luiz Dulci no livro Brasil: entre o passado e o futuro. No artigo, Dulci ressalta o estímulo e reconhecimento dos movimentos sociais como componente de origem do Partido dos Trabalhadores e parte inexorável da agenda do governo Lula.  Destaca as 63 conferências nacionais que ocorreram durante o governo do PT, nas mais distintas áreas de atuação governamental, que teriam mobilizado cerca de 4,5 milhões de pessoas em mais de 5000 municípios brasileiros.
Outro ponto destacado por Dulci é o reconhecimento dos “novos direitos” e a institucionalização de esferas que garantam espaço na agenda horizontal de governo e estimulem o debate na sociedade em torno de questões cruciais como o preconceito de raça, a desigualdade de gênero e o papel da juventude. No geral, esse esforço é reconhecido pelos movimentos sociais como um avanço com relação ao governo anterior, que contribuiu para que deixassem a resistência para uma postura ofensiva no diálogo com o Estado. Apresentam-se não como anexos do Governo, mas tendo garantido sua independência e cobrando, insistentemente, avanços. Deve-se sublinhar, todavia, que esses movimentos sociais conformarem a base de sustentação do Governo Lula no auge da crise política pela qual passou ainda no primeiro mandato.
A grande promessa para o próximo período, que talvez só consiga ser concretizado nos próximos anos a depender do resultado das eleições de outubro, é o projeto de Consolidação das Leis Sociais, em discussão conduzida pela própria equipe de Dulci. A institucionalização dos ganhos representados pelas políticas sociais desenvolvidas nos últimos anos representará, sem dúvida, um grande ganho para a sociedade brasileira e um marco histórico para o Brasil.
Todavia, a questão da participação social está longe de ser resolvida. Consigo perceber três grandes objetivos desse estímulo ao alcance de um envolvimento maior da sociedade na agenda pública. O primeiro diz respeito a própria ligação, sadia, do governo com a sociedade, com o cidadão comum. Representa, teoricamente, um contato direto capaz de contrapor as demandas organizadas da sociedade e as ofertas propostas pelos poderes públicos. O segundo, relaciona-se com o controle social da ação pública, mecanismo útil para se contrapor aos privilégios e promover a universalização dos direitos, como argumenta Dulci. Por fim, mas não menos importante, as possibilidades de participação social servem de estímulo à ação cidadã do indivíduo e à mobilização associativa. Esta uma tarefa permanente.
Dentre as duas anteriores, creio que há espaço para avançar. Os instrumentos dispostos pelas tecnologias de informação servem muito bem à transparência e ao controle do gasto do governo, que lançou, recentemente, o portal da transparência. Mas todo o processo de gestão que antecede à realização do gasto, como o acompanhamento da execução na ordem das prioridades acordadas, por exemplo, não é por aí coberto. Seria necessário estabelecimento de diálogo direto e constante, com atores específicos. Como e quais atores participam é questão difícil e ainda aberta.
Por fim, a transformação do cidadão de objeto para sujeito da ação pública, corresponsável pela política, aponta para um longo caminho a ser percorrido. A participação dos movimentos sociais, ONGs, ainda que em parcerias, na execução das ações de responsabilidade do governo é ardilosa. A discussão da forma de implementação e desenho das ações a serem desenvolvidas é restrita e muitas vezes, secundária à discussão do montante dos recursos. No entanto, são aspectos que iluminam as vias que podem ser exploradas.
Como comentário final, dois elementos que vejo como importantes nessa construção. Os agentes sociais (agentes de leitura, de segurança cidadã, de saúde...), fortalecidos nos últimos anos podem ser mais úteis na construção desse processo. A criação de rede entre eles para a troca da experiência e a criação de mecanismos de diálogo sistemático com os formuladores de políticas pode ajudar a melhorar a oferta que chega de cima. E, como não poderia deixar de ser, a questão territorial. A eleição do território como plataforma preferencial de integração das políticas públicas e de auscultação social.
Ouvidorias são importantes. Mas mais importante é a resposta articulada que o Estado pode oferecer em forma de resultados.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Complementaridades e princípios

Esse é o primeiro post sobre os artigos que compões o livro Brasil: entre o passado e o futuro, organizado por Emir Sader e Marco Aurélio Garcia, lançado no congresso do Partido dos Trabalhadores que oficializou o nome de Dilma Roussef como pré-candidata à presidência da república. E, pelo viés deste humilde blogueiro, trata do texto de política externa, escrito pelo próprio Marco Aurélio Garcia, assessor especial de assuntos internacionais da Presidência da República.

No geral, o texto apresenta críticas superficiais à política externa do governo FHC e destaca as principais linhas da política externa de Lula, sem apresentar qualquer novidade em termos de propostas quanto à política externa de um possível novo governo comandado pelo PT. De fato, traduz que  Dilma representa, sobretudo, à continuidade do Governo Lula, sendo este o seu principal mérito.

Dois temas são marcantes no texto de MAG. O primeiro se refere às complementaridades.
Complementaridades entre (a) as condições internas construídas durante o Governo Lula que preenche, segundo sua visão, uma lacuna histórica do desenvolvimento brasileiro - modernizar o país promovendo um mudança estrutural, sobretudo pelo enfrentamento das desigualdades e (b) a realidade do sistema internacional que transparece a queda da hegemonia americana e a ascensão da Ásia (China, Índia e Rússia) na construção de um mundo multipolar que ainda preza o multilateralismo. Dessa complementaridade, surgem as opções de movimentação internacional do Brasil, que mostra uma política externa ativa e altiva, nos dizeres do seu Chanceler. E que busca complementaridade entre altivez e solidariedade, e entre solidariedade e interesse nacional, principalmente no tratamento de sua grande prioridade - o relacionamento com os vizinhos sul-americanos. A integração regional, nesse ponto, é apresentada como um elemento constitutivo do projeto nacional de desenvolvimento.

A prioridade concedida à América do Sul é apresentada como parte complementar a um movimento maior de articulação Sul-Sul, no qual se destaca a articulação do Brasil junto à África do Sul e Índia, formando o fórum IBAS, à aproximação com os BRICs, além de fóruns inter-regionais que fortalecem a presença da América do Sul como sujeito político internacional.

O segundo aspecto destacado pelo professor Marco Aurélio Garcia são os princípios nos quais se assentam a atual política externa brasileira, que a difere da processada durante o governo anterior. Em primeiro lugar, um renovado sentimento de afirmação nacional de um país que busca ampliar seu espaço no cenário global, mostrar-se acima das suas sandálias, superar o complexo de vira-lata que norteara a projeção internacional do Brasil. Às críticas de partidarização da política externa, sua posição é firme: relembra-nos da filiação partidária do então chanceler Cardoso, ainda no governo Itamar, das linhagens tucanas de Celso Lafer, mostrando que, ao lado de outros exemplos, essa é uma prática normal que perpassa todos os governos. A implementação de políticas não deve ser um exercício meramente técnico. defende com razão.

Em segundo lugar, a confiança em um multilateralismo renovado, que possa lhe conferir nova legitimidade e perfil democrático.  A adjetivação do multilateralismo invoca a necessidade de reforma das principais instituições que conformam a atual ordem internacional, desde o CSNU, até o FMI e Banco Mundial, advogando ao Brasil um papel importante nessa construção. Não serviria a diplomacia a uma mera função pedagógica, ensinando os atores domésticos a se comportar de acordo com as normas internacionais, mas estaria ela, antes disso, envolvida e esforçada na construção dessas normas.

O autor não sublinha, contudo, as eventuais dificuldades que o sistema internacional impõe ao Brasil a partir do momento que se mostra um ator menos coadjuvante no palco mundial. As defesas dos EUA para evitar o seu próprio declínio econômico e político, as concorrências com os novos emergentes e os múltiplos arranjos existentes entre as tradicionais e novas potências.

Na tradução do seu presente, faltou uma leitura mais cuidadosa do atual sistema internacional e das suas possibilidades futuras. A complementaridade das relações sul-sul com aquelas tradicionais e importantes ligações com o norte também foi um tanto negligenciada. Conquanto isso possa ainda impor dúvidas sobre as melhores opções de política externa a serem executadas no futuro próximo,  não deveria obscurecer o destaque que merecem os avanços obtidos pela atual política externa com relação ao seu passado mais recente.